Ponte estaiada PPP

Orig­i­nal­mente pub­li­ca­da no blog Só Sergipe http://www.sosergipe.com.br/debate-parcerias-publico-privadas/ e, em 26/05/2015, blog SUDEN

O exame dos méri­tos das parce­rias públi­co pri­vadas, PPP, como for­ma de mod­ern­iza­ção da prestação de serviços públi­cos ao cidadão, tem sido prej­u­di­ca­do no Brasil por um debate recor­rente­mente pobre. Parte dessa difi­cul­dade é intrínse­ca ao proces­so: PPP pres­supõe oper­ações finan­ceiras estru­tu­radas, avali­ação de riscos, pro­je­tos finan­ceiros de cer­ta com­plex­i­dade e uma estru­tu­ra de garan­tias jurídi­cas bas­tante sofisti­ca­da. Temas ári­dos, por­tan­to, para o debate políti­co e super­fi­cial que infe­liz­mente dom­i­na a cena política. 

Mas a maior parte des­ta incom­preen­são decorre de um con­fron­to ide­ológi­co. Fortes inter­ess­es eleitor­eiros e cor­po­ra­tivos pref­er­em con­fundir a opinião públi­ca com o uso de con­ceitos sim­plis­tas que reduzem ter­ce­i­riza­ções, con­cessões, pri­va­ti­za­ções e PPPs à mes­ma coisa, basea­d­os na lim­i­ta­da ideia de que, sendo obje­to de inter­esse do cap­i­tal, todos ess­es instru­men­tos servem ape­nas para ger­ar lucros e reduzir o poder do Esta­do. Assim, parece bacana ser con­tra tudo isso achan­do que se está defend­en­do o Esta­do e lutan­do quixotesca­mente con­tra o cap­i­tal … e, afi­nal, enten­der como fun­cionam ess­es instru­men­tos é coisa de tec­nocra­ta, e indigna de atenção séria.

Passa desaperce­bido a essas pes­soas que o que mais reduz a con­fi­ança nos entes estatais hoje é jus­ta­mente a inca­paci­dade de prover serviços públi­cos efi­ciente em qual­i­dade e preço. Na con­tramão do sim­plis­mo, acho que as PPP são fer­ra­men­tas de con­tratação extrema­mente impor­tantes para o setor públi­co. E como fer­ra­men­tas que são, é claro que tan­to podem ser bené­fi­cas como mal uti­lizadas. Mas é inegáv­el que trazem méto­dos efi­cazes, que podem faz­er a pop­u­lação se ben­e­fi­ciar de práti­cas mod­er­nas de con­tratação, gestão de riscos, finan­cia­men­to e intro­dução de mel­ho­rias tec­nológ­i­cas e de gestão no serviço público. 

Isso é tan­to mais impor­tante no Brasil porque em nos­so país a gestão públi­ca está com­ple­ta­mente amar­ra­da por um mar­co reg­u­latório anacrôni­co, que quase invi­a­bi­liza práti­cas de excelên­cia na gestão. Prati­ca­mente em todas as áreas impor­tantes para a efi­ciên­cia das empre­sas públi­cas, como, só para um rápi­do exem­p­lo: i) recur­sos humanos (lim­i­ta­da nas for­mas de ingres­so, desen­volvi­men­to de car­reiras, qual­i­fi­cação, mer­i­toc­ra­cia, desigual­dades salari­ais e de van­ta­gens nas grat­i­fi­cações e na pre­v­idên­cia, pro­du­tivi­dade, isono­mia salar­i­al e inad­e­qua­da garan­tia de esta­bil­i­dade no emprego públi­co em fla­grante con­tradição com a pre­cariedade dos empre­gos pri­va­dos), ii) con­tratações de bens e serviços, lim­i­ta­dos pela anacrôni­ca Lei 8.666, lim­i­ta­dos a uma fis­cal­iza­ção for­mal hipertrofi­a­da face a uma ver­dadeira dis­plicên­cia na gestão dos con­tratos e garan­tia de qual­i­dade no fornec­i­men­to dos bens e serviços pos­te­ri­or ao rig­or dos proces­sos lic­i­tatórios; iiic) graves lim­i­tações ao finan­cia­men­to (o Esta­do brasileiro só aces­sa crédi­to para inves­ti­men­tos em obras físi­cas, e os Gov­er­nadores pre­cisam cin­gir seus pro­gra­mas à ofer­ta dos agentes finan­ciadores e do orça­men­to da União, que dessa maneira limi­tam extra­or­di­nar­i­a­mente a ação dos Esta­dos e municí­pios); iv) com­ple­ta invi­a­bil­i­dade de gestão mod­er­na de riscos e aces­so a ino­vações tec­nológ­i­cas; v) cic­los políti­cos muito cur­tos que impe­dem o amadurec­i­men­to de boas práti­cas cor­po­ra­ti­vas pela ingerên­cia políti­ca na gestão empre­sar­i­al, … e ain­da have­ria um alfa­beto inteiro de exemplos.

Veja que não se tra­ta de achar que a gestão pri­va­da é boa e a gestão públi­ca é ruim, por algu­ma razão intrínse­ca ou questão de fé. Eu, por exem­p­lo, defen­do a gestão públi­ca e sou con­tra a pri­va­ti­za­ção de serviços essen­ci­ais. Acho que o Esta­do não pode renun­ciar a uma estru­tu­ra forte para a gestão dos serviços públi­cos, inclu­sive opera­cional­izan­do-os dire­ta­mente sem­pre que pud­er fazê-lo de for­ma efi­ciente, e isso sig­nifi­ca a um cus­to que o cidadão pos­sa pagar, saben­do que é mais bara­to ou mel­hor que uma alter­na­ti­va privada.

Em ativi­dades como o fornec­i­men­to de serviços de água e esgo­to, acho que pre­cisamos de empre­sas estatais efi­cientes. Como sergi­pano, não abro mão da DESO, e vi com orgul­ho como a empre­sa super­ou o recente prob­le­ma da que­bra da adu­to­ra no Ponte de Pedra Bran­ca. E acho que, mes­mo diante das difi­cul­dades estru­tu­rais já apon­tadas, muitas empre­sas públi­cas con­seguem níveis sat­is­fatórios de res­o­lu­tivi­dade no atendi­men­to ao con­sum­i­dor, muitas vezes graças ao empen­ho de diri­gentes e servi­dores de alto grau de com­pro­me­ti­men­to público.

Mas adi­cionar a essas regras a ino­vação tec­nológ­i­ca, capaci­dade finan­ceira e a exper­tise de par­ceiros pri­va­dos – mes­mo levan­do em con­ta que eles bus­cam     opor­tu­nidades de lucro, não de filantropia – sig­nifi­ca aumen­tar a efi­ciên­cia da gestão públi­ca, e não a descar­ac­teri­zar. 

No caso dos serviços de água e esgo­to – em Sergipe, a nos­sa DESO, como tam­bém os serviços munic­i­pais em algu­mas cidades – lem­bro que metade da pop­u­lação brasileira, ou mais, não aces­sa serviços de esgo­ta­men­to san­itário. E esse prob­le­ma só se resolve com inves­ti­men­tos altos, que o aporte públi­co soz­in­ho não poderá resolver em pra­zos de tem­po razoáveis. Bas­ta ver que nen­hu­ma con­ces­sionária no Brasil pode ban­car os inves­ti­men­tos de expan­são das redes de água e esgo­to soz­in­has, a não ser que pra­tiquem preços muito mais altos que os atu­ais e inviáveis para a pop­u­lação pobre.

PPP então per­mitem, de uma só vez: bus­car crédi­to através dos par­ceiros pri­va­dos, que assim agregam capaci­dade de inves­ti­men­to que, soz­in­ha, a empre­sa públi­ca não teria; via­bi­lizar a intro­dução de méto­dos e téc­ni­cas ino­vado­ras; ben­e­fi­ciar-se da gestão pri­va­da, no que for mais efi­caz para o desen­volvi­men­to dos serviços, per­mitin­do à empre­sa públi­ca focar seus obje­tivos soci­ais, e evi­tar dis­per­são, del­e­gan­do as ativi­dades com­ple­mentares à sua ação. Isso pode per­feita­mente ser feito sem demi­tir pes­soal das empre­sas, sem pri­va­ti­zar nada, sem reduzir a pre­sença dessas estatais jun­to à pop­u­lação. Pode, ao con­trário, ser um instru­men­to de mel­ho­ria da sua imagem per­ante o con­sum­i­dor, que vai saber recon­hecer ime­di­ata­mente a mel­ho­ria da qual­i­dade na prestação de serviços. 

O poten­cial dess­es instru­men­tos é imen­so. Vale lem­brar o exem­p­lo atu­al do Rio de Janeiro. Lá, foi uti­liza­do um instru­men­to intro­duzi­do há poucos anos no Brasil pelo Estatu­to das Cidades: tra­ta-se do CEPAC – Cer­ti­fi­ca­dos de Poten­cial Adi­cional de Con­strução, que são val­ores mobil­iários emi­ti­dos pelas Prefeituras. Ess­es títu­los são uti­liza­dos como meio de paga­men­to para a out­or­ga do chama­do Dire­ito Urbanís­ti­co Adi­cional. É um instru­men­to finan­ceiro, que no caso do Rio foi trans­for­ma­do pela Caixa Econômi­ca Fed­er­al em um fun­do capaz de finan­ciar oper­ações de PP den­tro do pro­je­to chama­do de Por­to Maravilha.

Ou seja, um instru­men­to finan­ceiro é capaz de “traz­er” o futuro para os dias atu­ais, através de um títu­lo finan­ceiro que assim pode garan­tir inves­ti­men­tos pri­va­dos, real­iza­dos ago­ra, no momen­to pre­sente. Avali­a­dos dev­i­da­mente os riscos, insti­tu­ições finan­ceiras trazem a val­or pre­sente ess­es títu­los e finan­ciam as obras de mel­ho­rias dos serviços urbanos que a Prefeitu­ra do Rio ofer­ece. É como se o sis­tema finan­ceiro per­mi­tisse pre­ci­ficar hoje, para via­bi­lizar os inves­ti­men­tos necessários, os enormes bene­fí­cios que a cidade poderá auferir em um pra­zo de duas a três décadas.

Não há dúvi­da que isso per­mite a ofer­ta de serviços à pop­u­lação que, pelos mecan­is­mos tradi­cionais de con­tratação de serviços seria impos­sív­el oferecer. 

Esse é um belo exem­p­lo, den­tre muitos (ain­da que exis­tam tam­bém exem­p­los de mau uso de PPP no Brasil). PPP podem faz­er com que as empre­sas estatais ofer­eçam serviços mel­hores à pop­u­lação, con­tin­uan­do estatais, mas operan­do a um cus­to menor e amplian­do a ofer­tan­do serviços muito mais rap­i­da­mente. Assim, PPPs valem à pena, ain­da que careçam, como qual­quer out­ro instru­men­to com­plexo de gestão, ser dev­i­da­mente anal­isadas e cuida­dosa­mente imple­men­tadas. E, bem-feitas, em nada fer­em os inter­ess­es dos servi­dores públi­cos ou da pop­u­lação, ben­e­fi­cian­do a própria empre­sa e os os con­sum­i­dores dos serviços. 


 

O blog SóSergipe publica debate sobre PPP

Leia a pub­li­cação orig­i­nal no link: http://www.sosergipe.com.br/debate-parcerias-publico-privadas/.


Foto de José de Oliveira Júnior
Oliveira Júnior defende PPP em debate
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Oliveira Jr.

Economista. Especialista em Ciências Sociais (Estado e Sociedade no Nordeste do Brasil) e Empreendedorismo. Mestre em Tecnologias Emergentes em Educação (Must University, 2022).

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